31 de ago. de 2019


a água do tanque antigo
se arranja sem bochicho
já que a rã já baixou

30 de ago. de 2019

red notes


verter a noite numa taça
e sorvê-la.
se houver outra taça,
dividir a noite
e deixar-se sorver.

29 de ago. de 2019

ilha de maré


ainda ouvi do meu peito
um desaguar,
um murmúrio de leito
que corria sem nunca passar.

ouvi os atritos das nuvens
no queixo do ar,
roçando branduras
e desconjuntando do amor
suas armaduras mais nulas.

mas e meu amor,
que tanto ouviu
a voz desse rio,
onde se foi derramar?

aqui o mar soa rouco.
 mas noutra estação,
canta outra canção.

27 de ago. de 2019

miardo


a novela do gato
na lã da horta
querendo ter hálito
de hortelã

o altruísta


livre-vos deus
agora mesmo
deste egoísmo
que é só meu.

25 de ago. de 2019

o perguntador mudo


perguntam-me
que coisas deixarei quando
eu partir deste mundo.

mas o que
poderei levar?
nada? pergunto.

então digo
deixarei tudo.

22 de ago. de 2019

luz e pedras


tempos de escurecimentos...
e a mineração que pratico
ainda é o que salva.

alguma pouca poesia barrenta
na jazida dos seus olhos
e à claridade
eles me extraem.

saio rico,
sem ter nada.

apocalapso


feras berram em lamentos
o tormento desse inferno é o que lhes resta
um messias, a própria besta

20 de ago. de 2019

19 de ago. de 2019

na banca de tiro ao alvo


matarei-me neste plano
pra nascer melhor no outro
(ou nos outros).

pretendo pegar uma telona
ainda hoje. juntar minhas balas
(essas mesmas de borracha)
e da esteira da manada
desgarrar-me.

não tô afim de pipoco.
vou ver o tarantino mais novo
—dizem que é menos revolver
(mas não menos fogo).

e você,
pequeno pato,
qual seu plano
pra hoje?

17 de ago. de 2019


um girassol
na noite tinta
fica tonto

o ser


a chuva dedilha antigas cantigas
em novas poças d'água.
e em meus braços
na novidade das palavras mal formadas
a poesia

que,
sem carecer de nada,
é.

12 de ago. de 2019

canção de inverno


andorinha, não me venhas
perto assim do meu relógio
pra falar de amor eterno

nada dura, sabes não?
primavera, outono, inverno...
só conheces o verão

8 de ago. de 2019

espelho, espelho seu


eu não sei amar
eu não tenho um sonho
nunca me proponho
ir pro seu lugar

eu não faço sexo
eu não tenho fomes
entre os nossos nomes
nunca houve nexo

não ache isso complexo
desmanche nosso amor
e —faça-me o favor!—
meu nome é só reflexo

e só
mesmo
um demorado abraço
para tirar o atraso
de ter estado a esmo
e só

6 de ago. de 2019

trajeto


prefiro o trajeto discreto,
quase poético
nos tantos rodeios.

já não sou de ir tão reto,
como a tua imagem
nas vezes que me veio.

quero chamar-te minha flor?
até te chamo,
mas eu floreio.