26 de jan. de 2020

conversa


sobre utopias
nem mais um pio

só o silêncio
a ter ciência

dessas insânias
que são as minhas

conversas
com versos.

25 de jan. de 2020

chão frondoso


meu chão achou em mim
lugar pra crescer.
conheci de suas flores os anseios,
sondei de seus caules o apetite,
na fertilidade nos vinculamos,
nos recostamos um no outro
pelas solas dos meus pés.

não sou eu o aparador de suas ramas,
quero-o chão frondoso.
a ele eu meu apego
e é pelo apego que suponho:
nossas seguras raízes
fui eu que fixei
neste céu que daqui vejo.

16 de jan. de 2020

síngulo


é sem dor
te amar.

se ofício,
sem esforço.
feito fácil.

a dor só está
se o amor é singular:
quando estou eu,
mas não estás.

14 de jan. de 2020


meu sustento
eu mesmo sustento,
depois eu invento
um vento pra mim.

13 de jan. de 2020


o vento sopra
a ave ouve e sabe
o vento sopra a outros nortes
à ave nada cabe

mas a verdade é que a verdade
habita as brancas asas
e se expõe num espanar sem voo
sempre que o vento a ave ouve e sabe

8 de jan. de 2020


isto que você vê
é só isto que você vê
se nada mais houver
de fato para ser visto

e como saber se há?
não basta o olho abrir
o olhar requer abrigo

7 de jan. de 2020

crito


aquilo não era um falar

gritava
paria palavra
com dores de quem escreve

carne se fazendo verbo
um grito da própria verve
que a nenhum ouvido serve
mas faz a alma singrar
desertos de pele

5 de jan. de 2020


água passada não volta,
veloz é a corrente.
quem quer que algo volte,
passe
                                 na frente.

4 de jan. de 2020


ressignificar como exercício
e tornar a perguntar-me
o que significam os teus signos.

toda a matéria que já fez ou que fará
tudo que é paz e tudo que é guerra
divide a mesma cela nesta terra

3 de jan. de 2020

2 de jan. de 2020


tão dissimuladas
as palavras que a boca
fez que não disse

e tão evidentes
as que de fato não disse,
mas no fim dissidentes.

desejos de linguagem


da língua,
o lugar predileto
é o dialeto.

tateia, vagueia, passeia,
põe sangue quente na veia
e ao corpo que lhe toma
         —o idioma—
inunda e incendeia.

dessa viva paragem
faz sua roça
e o que lhe coça, longe dela,
são desejos de linguagem.

1 de jan. de 2020


cada passo
é um caminho
que eu traço

cada caminho
por mais solitário
e por mais que pareça o contrário
nunca é sozinho