29 de dez. de 2006

haicai i

o céu no horizonte
acordando devagar...
hora de eu dormir!

27 de dez. de 2006

olhar além

ela vem vindo com o inédito exemplar
de sua lista indefinida de romances
como quem vem de outro leilão sem muitos lances
e sem produtos que lhe venham a agradar.

vem sem coragem nem vontade de sorrir
talvez cansada de buscar sem encontrar
mas não percebe que essa trilha vai falir
sua própria imagem, seu encanto para amar.

pobre morena, o seu olhar pode ir além
e nesse alcance tirará suas conclusões:
ou é você que tanto gosta de iludir-se

ou, iludida, não desfaz suas pretensões.
desejo sorte em sua estrada a expandir-se,
só não esqueça que ao seu lado existe alguém.

versos fáceis


pedra que bate na cumbuca seca faz virar
vento que topa no veleiro solto faz vagar
tapa da bem-te-vi no filhotinho faz voar
chuva que molha a terra do campeiro faz cantar

olho que mira fundo tal qual faca faz tremer
roupa que é quase pouca sobre a pele faz suar
cheiro que cerca inteiro feito abelhas faz sofrer
boca que pede um beijo demorado faz calar

meias-palavras bastariam pra me endoidecer
mas teu prazer é apreciar essa aperreação
que tanto me transtorna e dos pensares faz perder
todos os versos fáceis sobre ação e reação

14 de dez. de 2006

nos tempos do Natal de cá

salve, salve, Menino Jesus,
moreninho das terras de lá!
por aqui tua roupa é lilás
e és tão branco e com olhos azuis.

manjedoura?! ficou para trás
nos presépios do Santo de Assis,
junto com todos os animais
seus pastores e palhas e afins.

teu cenário-regaço mudou:
grande árvore ornada de neve,
uma estrela que ao topo pousou
e bonecos e bichos de pele.

é isso aí, seu Menino Jesus...
pega mal vir pros lados de cá
nesse tempo em que o medo reduz
a inimigo até quem é da paz.

e em meu canto procuro um sentido
pra um Natal que te fez de refém,
pois pra quem vive assim escondido
é melhor ir de novo a Belém.

11 de dez. de 2006

ANTIGOS VERSOS RELEMBRADOS

original

nossa relação não é profissional
nossa relação não é extra-conjugal
nossa relação não é artificial
nossa relação não é irracional...

nossa relação não é anfi-teatral
nossa relação não é do estilo 'carnaval'
nossa relação tá bem longe do banal
nossa relação tá mais perto do ideal

nosso amor
é o amor natural,
é o amor original,
é um amor cordial,
racional e emocional!



o sol virá

quando eu for sair para ver o sol
quero te levar, nem que tenha que acordar você
desses sonhos tão distantes e vazios...
deixe o vento conduzir e refazer nosso sonhar

quando o sol sair pra redesenhar
o que se apagou e o que se gelou do amor, então
será hora de abrir as suas janelas
vamos nos aquecer e entender o que virá

passa o meio-dia e a tarde vai chegar
e o tempo novamente vai querer nos esfriar,
mas se estivermos juntos nada vai nos consumir
nem o temporal que o céu pretende derramar

quando o sol se for pra dar seu lugar
ao som silencioso de um luar que vai velar por nós
feche os olhos ao meu peito e se entregue
e vamos esperar que certamente o sol virá



teu perdão

se o que digo é sem sentido
e o que penso é sem razão
se os meu atos são ridículos
e os meus caminhos, contramão...

se magoei teu pé ferido
naquela dança de salão,
se o meu amor não tem nutrido
o teu cansado coração...

grita comigo, faz qualquer coisa,
me dê a sua mão.

só não me deixe mais escaldado
nesse teu caldeirão
de manha e vaidade

na verdade sou o teu:
brinquedo quebrado,
boneco esquecido bem no fundo do porão,
querendo conserto,
chamando atenção,
fazendo de tudo pelo teu perdão.



ninar (realmente) feliz

olhe, a noite já vem
e as estelas, no céu,
vêm trazendo a lua
que te diz bem baixinho:

-- vai dormir, meu amor,
(que) o amanhã vai chegar
com um dia bonito,
com a paz de um sorriso

de alguém que te quer
um amor bem maior
e a maior alegria
que alguém pode ter.

dorme em paz, meu amor...
que este amor vem de Deus
e alimenta seus sonhos
e refaz teu viver.

7 de dez. de 2006

vida cafeína

o jornal denuncia mais um caso:
"aviões outra vez sofrem atraso"
e eu, de tão trôpego que ainda estava,
nem percebi que um dos dedos borrava
numa das folhas do policial.

vida cruel pra quem cedo madruga
e, dependendo da própria labuta,
tarde, com sorte, consegue escapar,
quando não preso, cativo dum bar.

vida amarga, quando nem os sonhos
trazem pra perto o afã de viver
com cafeína e sem ter que dizer:

café escasso,
acabou-se o que era amargo...

5 de dez. de 2006

sangria d'coeur


de tanto te ver em tuas voltas e idas
sabendo de cor tuas promessas falidas
rejeito tuas flores, palavras não ditas
e deito-me muda com minhas feridas

nessa eu já não caio qual alma vencida
e nem me atraio de tão repelida
não é só tua lábia que tanto me irrita
mas tua cabeça, tão pouco crescida

portanto me esqueça, estou arrependida
de um dia ter crido no "amor da minha vida"
que em meu coração (de passagem irrestrita)
mal ia entrando e já via a saída

3 de dez. de 2006

janelas dos sonhos

dei vazão aos sonhos, dormi.
o passado visitou-me, maduro como presente,
mas seus sabores continuavam os mesmos.

a mesma sensação de não ter feito o que devia,
de não ter provado a fruta tantas vezes oferecida.

no lugar da ação, apenas a intenção...
no lugar do experimento, somente sonhos.

aquele passado fica pra trás,
lugar pra onde não se deve ficar olhando,
a não ser pelas janelas abertas dos sonhos de uma noite a dormir.

17 de nov. de 2006

pitadas de NÃO

acorda pra vida, irmão
que o tempo não sabe esperar
quem sempre viveu aceitando
um dia talvez vai negar

quem sempre a corrente levou
resolve nadar contra o mar
e o tempo que nunca parou
quem sabe, vai não concordar

acorda pro tempo, irmão
que a vida insiste em ensinar:
o fogo e a água se dão,
só basta saber temperar

o amor com seu doce sabor
tem suas pitadas de não
senão, é do tempo impor
o amargo sabor, solidão

18 de set. de 2006

novas primaveras

recortes de fotos digitais
remetem a lembranças reais...
a garganta se espreme,
dificultando os goles
e os suspiros surgem
talvez como leve consolo para o peito apertado

nenhuma primavera será mais
como a dos antigos setembros...
uma nova cor se revela pela luz,
uma nova flor que antecipa dezembro

2 de fev. de 2006

O Pequeníssimo Conto da "Sinistra Mão Tiranosuicida"



Fora, excepcionalmente, a primeira a mostrar-se acordada à pouca luz do mais novo tedioso dia que estava chegando. Começou seu serviço serviçal coçando uma lúpia avermelhada que um pernilongo deixou na perna direita calombenta durante aquela madrugada e que, agora, fazia-se sentir mais ardentemente. Como que tomando consciência do fato de ter sido a primeira a acordar, concluiu que a destra só poderia estar dormente e inerte ante o sono ou o peso do resto do corpo sobre aquele respectivo braço. Foi assim que vislumbrou a grande chance de inaugurar e cerrar de uma vez a sua própria liberdade; de sentir-se útil e potente diante da tirania, agora mórbida, da massa encefálica e de sua fiel súdita - a destra -, mesmo que num ato derradeiro e de fenecimento próprio. (Também não queria mais fazer o papel de aia da aia e acordar, com muito esforço, a destra, retirando-lhe debaixo de todo aquele peso)

Tomou-se, então, de um ímpeto próprio dos que são jacobinos e, assim, mesmo sem a destreza de seu simétrico rival (sempre preferido e treinado pelo tirano encarcerado em castelos cranianos), apoderou-se do velho punhal enferrujado que sempre era obrigado a carregar, mas nunca a dirigir. Agora poderia mostrar, não sua habilidade, pois não a tinha, mas todo o seu furor desgovernado sobre tais escravizadores. Acabaria de forma fulminante aquela tirania se atacasse um duto sangüíneo; ou de maneira lenta e cruenta caso apenas fendesse a carne com o tétano daquela imundícia. Sua ira fazia seu sangue ferver e esta quentura, ao mesmo tempo que lhe dava força, como o vapor quente à locomotiva, fazia-se dissipar pelo braço e logo haveria de chegar à base de controle do grande presídio; teria que agir rapidamente, talvez de súbito. Mas como, se nunca foi chamado a ser o protagonista das histórias (e, sim, o figurante sempre)? A quentura parecia ter chegado aos cortinados das ventanas que levam a luz ao grande tirano, pois que seus faróis pareciam já mover-se e os panos ensaiavam levantar-se. Os olhos não em muito tempo se abririam e entregariam a sinistra traidora ao tirano rei, enquanto que aquela espremia o punhal com toda a força que conseguia burlar do grande controlador desacordado.

Como se já esperasse, a sinistra pareceu ter consentido deixar os faróis lhe dedurarem ao tirano plúmbeo, que invocou de imediato sua escudeira fiel, escrava conformada e condecorada com todo o trabalho. Foi assim que a destra se viu impotente pois que ainda demente com a falta do sangue prensado pelo corpo. O sangue cálido que borbulhava o pulso da sinistra já havia chegado também na bomba que então batia em ritmos mais apressados para que logo fosse cuspido ao resto dos vassalos como sinal de alarme. A sinistra já se sentia impotente e atemorizada nem tanto pela quantidade de vassalos que estavam prestes a investir contra ela, mas que pelo sangue que acordara de vez a massa tirana e suscitara a incapacidade e pretermissão que sempre foi o seu grande estigma.

Já não tinha mais razão visto que a própria razão despertara, recompondo sua "dura lex". Nada mais a fazer senão largar o punhal velho e enferrujado e cuidar de acordar a destra (preferida do rei) ainda adormecida e atordoada, coçar mais algumas vezes o calombo ardido e servir em seus serviços serviçais a mais um fatídico dia que prometia para si tédio e desprezo. E, assim, continuava a ser a aia da aia do rei.

17 de jan. de 2006

pobre mocidade

de onde vem a inspiração dos antigos,
dos sambistas, trovadores do amor
que mastiga de tristeza os abrigos
moribundos, maculados de dor?

vem, quem sabe, do intragável sabor
de não ter ou perder os descompassos
que liberta, do cortante rubor,
o desejo de entregar-se aos abraços.

ou, talvez, do maior desembaraço
de viver tal como viveu Orfeu.
mas onde anda a inspiração, neste espaço
que, baldado, tudo já feneceu?

foi-se embora de onde o samba nasceu,
ou calou-se nos porões da saudade?
não! expulsa por essa mocidade,
despejada do glorioso apogeu...

12 de jan. de 2006

Prefácio

Este blog tem como intenção principal elencar os pensamentos, idéias, versos, contos, entre outras coisas escritas, de um cidadão comum que trilha a vida e, nos seus intervalos, cantarola e reflete a própria vida que já trilhou. Aqui, então, interlúdios da obra do palco da minha vida.

7 de jan. de 2006

interlúdios meus

entre uns e outros passos
minha vida pende num só pé
trilhando pontos esparsos
sem contar com a marcha ré

qual equilibrista
em cujos interlúdios vai
firme como maquinista
certo que a certeza trai.

são nos intervalos
que parte da mente sossega
e a outra, como em cavalos,
à cantoria se entrega.

interlúdio

[Adapt. do ingl. interlude - lat. med. interludium.]

S. m.

1. Mús. Trecho de música instrumental que se intercala entre as várias partes de uma longa composição, do tipo ópera, missa, cantata, etc.; intermédio.

2. Teatr. V. entreato (2).